Cotidiano | 14/10/2017 | 11:00
Opinião: Argentina 12 x 1 Brasil
Leitor Mario Eugenio Saturno*
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A Comissão de Ciência e Tecnologia do Congresso Nacional convidou o Tenente Brigadeiro do Ar Nivaldo Rossato para expor sua visão sobre o Programa Espacial Brasileiro.vO que mais causou espécie em sua apresentação foi o fato da Argentina investir 1,2 bilhão de dólares por ano em média, enquanto o Brasil investe apenas cem milhões. Realmente é muito estranho, como pode um país que tem um PIB de cerca de um quarto do nosso investir 12 vezes mais? E o território da Argentina é apenas um terço do Brasil.
Convivi quase dois anos com os tecnologistas da INVAP na fábrica de Bariloche, aprendi muito com eles -triste admitir isso-, e o que mais me impressionou foi o pragmatismo deles. O que talvez explique o porque cancelaram o programa de foguetes para ter apoio da NASA. Tiveram a oportunidade e aprenderam! Já fizeram diversos satélites, inclusive dois geoestacionários de comunicação (ARSAT).
Enquanto muitos brasileiros estão a acreditar na paralisação do Programa Espacial Argentino, em julho passado, anunciaram que a Hughes, empresa norte-americana, está associando-se à ARSAT para lançar o terceiro satélite de telecomunicações argentino, investindo cem milhões de dólares. Fato comemorado pelo presidente Macri -tido como inimigo da área espacial-. Outros 180 milhões serão investidos pelo governo argentino, mostrando que a crise não afeta tanto.
A Argentina ainda está terminando dois satélites radar, o SAOCOM (Satélite Argentino de Observação Com Microondas) é um sistema de satélites de observação terrestre equipados com um radar de abertura sintética (SAR) em banda L, com lançamento programado para 2018. Exatamente o que os cientistas do INPE querem para observar a Amazônia e o mar, mas o desenvolvimento do brasileiro parou. Os argentinos farão quatro satélites radar, o Brasil nenhum.
Outra observação a ser feita é que os dois satélites operarão em conjunto com os quatro satélites COSMO-SkyMed equipados com SAR de banda X da Agência Espacial Italiana, criando uma constelação para o Sistema Ítalo- Argentino para Gestão de Emergências (SIASGE). Um acordo internacional realmente útil e que o Brasil também necessita.
E os acordos do Brasil? O primeiro e mais importante é o CBERS, um programa de sensoriamento remoto em que o Brasil fabrica equipamentos que já sabe fazer e os chineses cuidam do controle e lançamento, coisa que não temos e eles não permitem que os brasileiros aprendam. Como este projeto envolve viagens para a China, ou seja, diárias gordas, as vagas são disputadas a tapa. Qualquer um vai observar que do lado chinês só tem engenheiros “trainee” enquanto que do lado brasileiro somente cabelos grisalhos... Novos, somente com a aposentadoria dos velhos. Com a prioridade de recursos humanos e financeiros, o CBERS sabotou todos os outros programas.
Para o CBERS, o Brasil investiu muito na criação de câmaras, são enormes, caras e que produzem imagens que os usuários não querem. Quando se tentou vender as imagens, ninguém comprou. Então passaram a distribuir de graça! Sem a gratuidade... Para que fazer no Brasil o que se pode comprar no mercado por uma fração do preço?
*Mario Eugenio Saturno é tecnologista sênior do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e congregado mariano.