Economia | 04/03/2020 | 11:34
A quem interessa o dólar em alta?
Andréia Limas
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Se você respondeu rápido e não teve a menor dúvida em apontar os exportadores, saiba que a resposta não é tão simples assim. Os próprios analistas do mercado divergem sobre quem ganha e quem perde com a valorização da moeda americana, que vem batendo recordes seguidamente. Quem exporta e, portanto, recebe em dólar, pôde em parte comemorar a disparada na cotação. Por outro lado, insumos e maquinários adquiridos fora do país também tornam a produção mais cara e isso pode refletir, a longo prazo, em majoração de preços no mercado interno, levando a um índice maior de inflação. De acordo com economistas, o repasse só não aconteceu ainda devido à fragilidade da economia brasileira, que não cresceu o esperado, e o temor de recessão.
Fator China
Os exportadores até podem aproveitar o momento para aumentar as vendas para o exterior. Mas, para isso, precisarão encontrar novos mercados, o que leva tempo. Maior comprador de produtos brasileiros, a China vive na economia profundos reflexos do surto de coronavírus. O vírus, aliás, está fazendo estragos na economia global, gerando queda de ações e diminuição no volume de negócios no comércio internacional.
Combustíveis e pão
Se a situação dos exportadores não é tão confortável quanto se imagina, pior ainda para os importadores, que veem o preço dos produtos aumentar e não conseguem repassá-lo ao consumidor. Mas essa condição talvez seja questão de tempo: se a alta continuar, as empresas não conseguirão mais absorver o impacto e caberá ao consumidor – todos nós – pagar a conta. E não estou falando de importados de luxo, carros ou perfumes, porém de itens como o trigo, base do pão nosso de cada dia e do macarrão, produto indispensável na mesa dos brasileiros. Há de se ressaltar, ainda, os combustíveis, que sob a nova política de reajuste têm os preços flutuando conforme o mercado externo e o efeito chega rapidinho às bombas.
Turismo
Conforme os analistas, o ministro da Economia, Paulo Guedes, está certo em um ponto na análise que fez sobre a disparada do dólar. A moeda americana em alta está afugentando os turistas que pretendiam viajar ao exterior, pois a valorização interfere no preço das passagens e das compras feitas fora do país. Isso pode ser bom, conforme apontou o ministro, para aquecer o turismo interno. Mas aqui há outra consideração a fazer: havendo aumento na demanda, qual é a tendência? O aumento de preços, como reza a lei da oferta e da procura, talvez o mais conhecido – e aplicado – conceito da economia. Além disso, com tantas incertezas sobre o futuro econômico, o mais provável é que as famílias adiem as férias, em vez de escolher destinos nacionais, como sugeriu o ministro.
Supervalorização
O dólar vem dando sinais de supervalorização desde o ano passado, entretanto, em fevereiro alcançou a maior cotação da história desde a criação do real, batendo nos R$ 4,50, quando as projeções apontavam para no máximo R$ 4,20 na estimativa para este ano. Segundo economistas, vários fatores podem ter levado a esse recorde, mas é quase unanimidade o papel de protagonista que teve o corte na taxa de juros. Com juros menores, o investimento estrangeiro acabou sendo direcionado a outros países, que oferecem taxas maiores e/ou menor risco. E com menos dólares no mercado, maior é a cotação da moeda.
Intervenção
Para conter a alta da moeda americana, o Banco Central tem feito intervenções no câmbio, como leiloar novos contratos de swap cambial, que equivalem à venda de dólares no mercado futuro, mas esses esforços ainda são tímidos e de pouco impacto. Seria necessário um posicionamento mais firme, para levar a cotação a níveis aceitáveis e de menor risco para a economia. Porque, se a disparada continuar, a preocupação, de empregadas domésticas a ministros da Economia, não será só as viagens à Disney.
Balança comercial
Com a maioria dos contratos de longo prazo, pelo menos por enquanto os efeitos da cotação do dólar pesam positivamente na balança comercial brasileira, que em fevereiro registrou o terceiro maior saldo da história para o mês, de US$ 3,096 bilhões. O resultado foi suficiente para reverter o déficit registrado em janeiro e o primeiro bimestre acumula saldo positivo em US$ 1,361 bilhão. Houve alta de 15,5% nas exportações, com destaque para a venda de petróleo, minério de cobre e ferro. Já as importações subiram 16,7%, principalmente pela compra, no mês passado, de uma plataforma de petróleo de US$ 2,2 bilhões. Os números foram divulgados na segunda-feira (2) pela Secretaria de Comércio Exterior (Secex) do Ministério da Economia.