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Economia | 01/11/2015 | 18:43

Crise do capitalismo: será o fim da história?

Juliano Goularti - juliano.goularti@canalicara.com

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A filosofia de Georg Wilhelm Friedrich Hegel, em Lições sobre filosofia da história publicada em 1837, produziu a controversa ideia de que na historia há um fim. Essa ideia resulta do projeto hegeliano de ver a história como o progresso da liberdade. Cento e cinquenta anos depois, Francis Fukuyama publica o ensaio O fim da história (1989) e três anos depois o livro O fim da história e o último homem (1992). Em ambos os trabalhos, Fukuyama discorre sobre a derrocada dos regimes socialistas no Leste europeu e em especial, a vitória da economia de mercado e da democracia liberal. Ao retomar o debate, o autor defende a ideia que a história chegou ao seu fim com a vitória das democracias liberais ante ao comunismo, ao fascismo e às ditaduras militares no continente americano. Para Fukuyama (1989; 1992), o fim da história significa que não existe a possibilidade de desenvolvimento de alguma forma de organização política superior à democracia liberal.

No contexto da atual crise economia do capitalismo, que tem origem na crise imobiliária do segmento subprime nos EUA em 2007, é possível pensar no fim do capitalismo? A crise financeira que estourou há quase dez anos e se propagou em efeito cascata continua seu curso, agravando-se, consideravelmente. De lá para cá bancos e empresas “grandes demais para falirem” entraram em falência ou simplesmente pediram concordatas, trabalhadores foram demitidos, a dívida pública de muitos dos países centrais passou de 100% do Produto Interno Bruto (PIB) e o número de pobres e miseráveis aumentou consideravelmente. Segundo o Bank for International Settlements (BIS), o volume de derivativos negociados nos mercados de balcão em junho de 2008 somavam US$ 596 trilhões, dos quais US$ 58 trilhões são de derivativos de crédito. Para salva o capitalismo da crise financeira criada pela sua irracionalidade endêmica da bolha de ativos, segundo a InfoMoney, os custos para os Tesouros Nacionais foram equivalente a US$ 14 trilhões, ou seja, valor equivalente ao PIB dos Estados Unidos em 2007 e 18% do PIB global de 2007. Mas segundo o jornal suíço NZZ am Sonntag esses cálculos são conservadores, o custo real pode ser ainda mais elevado.

Se o capital é o sangue que flui através do corpo político da sociedade capitalista, o crédito é o coração que bomba o sangue que e os leva pelo corpo através dos labirintos de veias e artérias. A questão é se interromper, retardar ou mesmo suspender o fluxo, deparamo-nos com uma série de complicações. É preciso recorrer ao médico para que o desobstrua as anomalias e o sistema volte a funcionar normalmente. A questão é: como sistema capitalista sobrevive às recorrentes crises e porque ao mesmo tempo o capitalismo é tão propenso a crise? A questão é que cada processo evolutivo do capitalismo no tempo e no espaço, mais amplo, mais diversificado e mais desenvolvido ele é. No entanto, somente o Estado, considerado como um “Comitê Executivo da Burguesia” por Marx pode salvar o capitalismo de seus desdobramentos irracionais. Ao contrário da ortodoxia liberal conservadora que defende laissez-faire em que o Estado Nacional tende a desaparecer como sujeito organizador do mercado, dado o grau de irracionalidade do capitalismo moderno, faz com que a sua relação seja indissociável do Estado. Em outras palavras, o Estado Nacional é quem garante os esquemas de valorização do capital. Por isso é muito difícil imaginar o nascimento, ascensão e consolidação do capitalismo sem o exercício do poder estatal, e sem a criação de instituições governamentais.

As mudanças no capitalismo nos últimos 150 anos foram gigantescas. O grau de complexidade do capitalismo contemporâneo é muito superior que o de 80 anos atrás quando Keynes escreveu a Teoria Geral do Emprego do Juro e da Moeda, mais dinâmico do que a 105 anos atrás quando Hilferding publicou O capital financeiro, mais complexo do que a 120 atrás quando Hobson escreveu A evolução do capitalismo moderno e mais perverso do que a 150 anos quando Marx escreve O capital. Por isso é que a classe burguesa cada vez mais se torna dependente das relações políticas do Estado para garantir sua reprodução. É um engano pensar ao contrário. O Estado não somente garante a defesa dos interesses do capital, mas também sua reprodução em escala ampliada. Por isso cada vez mais o capital necessita do Estado. Não existe o auto-salvamento do capitalismo, existe sim o suicídio. Por isso também que o capitalismo penetrou nas estruturas estatais, assumiu o controle da política econômica, atua na flexibilização das legislações trabalhista, financia campanhas políticas, etc... As alterações ocorridas no curso das últimas décadas na composição da riqueza e na dinâmica operacional do mercado financeiro tornaram o capitalismo mais complexo e contraditório. Portanto, o maior peso da riqueza financeira na riqueza global acompanhado do controle “coletivista” da riqueza se dá sobre a sua capacidade mediadora com o Estado.

Em tempos de crise, inevitavelmente a irracionalidade do capitalismo se tornar mais evidente. A pergunta é: será o fim do capitalismo? Não. Será o capitalismo capaz de sobrevier a essa crise contemporânea? Sim, é claro. Mas qual será o seu custo social e quem sairá perdendo? Neste caso, a ausência de quaisquer limites ou barreiras a autoridade política se defrontará com a obrigação de reciclar os ativos podres e tóxicos jogados na lixeira do Estado pelos fanfarrões que fazem suas apostas especulativas no cassino financeiro. Isto é, quem perderá com a crise da reciclagem dos ativos será o povo, pois haverá uma transferência massiva de riqueza do setor público para os bancos privados. O fato é, que mais uma vez, o capital nunca resolve suas crises, apenas contorna. Faz esse contorno através de sua relação de poder sobre o público, a qual impõe os custos da socialização dos prejuízos aos Estados Nacionais, que para reciclar estes ativos imprimem medidas draconianas de austeridade fiscal e ampliação da dívida pública as quais ameaçam a coletividade do bem-estar público.